As barragens serão para desmantelar
Ainda criança, visitei pela primeira vez uma barragem, no rio Douro.
Durante a visita escolar fomos conduzidos para uma pequena sala onde
existia uma janela envidraçada, com uma espécie de "contador" de peixes,
apontada como uma medida ambiental avançada para proteger a fauna dos
rios. Fitei essa janela demoradamente e tudo o que vi passar foram
detritos...
Recordo terminar a visita invadido por uma enorme tristeza...
Afinal aquelas estruturas gigantes, onde até uma criança podia
rapidamente perceber que levariam dezenas de espécies à extinção, eram
necessárias para produzir energia para alimentar o nosso estilo de vida.
Tenho bem presentes os relatos de homens e mulheres que sempre viveram
junto à zona ribeirinha do Douro, sobre a entrada no rio de cardumes de
salmão e sável, perseguidos por golfinhos que deles se alimentavam.
Estes peixes vinham desovar rio acima, depois de percorrerem muitas
milhas pelo Atlântico.
Entretanto o sável é pouco frequente e o salmão extinguiu-se no Douro.
Cresci a ver crescer a língua de areia do Cabedelo, hoje uma reserva
natural local. Assisti à remoção de areia do local, quando ainda era
permitida, para construir casas e estradas.
Mais recentemente,
todos assistimos, de forma quase impávida e serena, à crescente
reposição de areia nas praias portuguesas, paga a peso de ouro, para
apenas durar alguns meses, até terminar o Verão e o mar a levar consigo.
As praias que frequentei na minha infância já não existem. Sobram
pequenos resquícios de areia e o mar avança sobre a costa, de forma cada
vez mais destrutiva.
Entretanto Portugal fez recentemente notícia pelo mundo por estar durante vários dias a consumir apenas energia do vento...
Apesar de todos os avanços tecnológicos e das alternativas de produção
de energia entretanto encontradas, o país adormeceu à sombra de um
desastroso plano nacional de barragens, que insiste em manter, como no
caso do Tua.
Gostava de estar vivo para poder um dia assistir ao
desmantelamento de barragens em Portugal e à rápida recuperação dos
ecossistemas ribeirinhos e costeiros, bem como à reposição (gratuita) de
areia nas praias portuguesas, assegurada de novo pelo normal curso dos
rios.
E mesmo que já muito velho, poder assistir com os olhos que
a Terra há-de comer, ao regresso dos cardumes de salmão ao Douro,
perseguidos por bandos de golfinhos rio acima.
Quem sabe até, experimentar um mergulho no rio, como na capa do disco Psicopátria d'Os GNR.
Há uns tempos atrás, tudo isto soaria a meros delírios utópicos de alguém com mente ecologista. Agora já não.
Ver vídeo da National Geographic Society, sobre a maior remoção de uma barragem na história dos Estados Unidos.
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