Amigos da terra

De forma a diminuir as emissões de CO2 e ajudar a estabilizar o nosso clima, os jardineiros devem ver a sua actividade como mais uma força amiga do ambiente. Podemos começar por transformar relvados em jardins produtivos.

Quando toca a enfrentar os novos desafios ambientais, como reduzir a pegada de carbono e combater as alterações climáticas induzidas pelo homem, nós amantes dos jardins e do cultivo somos uma força a ter em conta. Convém no entanto não esquecer que a actividade não é tão amiga do ambiente como muitos supõem. Este tipo de pensamento, corrente, até mesmo em conferências organizadas sobre o tema, simplesmente não corresponde à verdade. Muitas actividades de manutenção e produtos utilizados em jardinagem estão longe de ser amigos do ambiente.
Quase todas as discussões em torno da jardinagem e da forma como as alterações climáticas a condicionam, parecem concentrar-se na 'adaptação a...'. Muitas pessoas me dizem, com alguma alegria, que qualquer dia poderão estar a cultivar e produzir plantas tropicais ao ar livre, em Trás-os-Montes, graças às alterações climáticas.
Em vez de me resignar em relação a esta questão, prefiro fazer alguma coisa agora para ajudar a travar o aquecimento global, reduzindo as emissões de CO2. Precisámos de ‘abrandar’ os nossos jardins. Os combustíveis utilizados para aquecer as estufas de produção de plantas ornamentais, nas máquinas de cortar a relva ou nos automóveis, em direcção ao horto, a energia utilizada para produzir, embalar, promover e transportar fertilizantes, pesticidas, máquinas e acessórios, tudo somado, e torna-se bem claro que esta actividade tem uma considerável pegada de carbono.
A ideia fantasiosa de que, simplesmente porque estamos a cultivar, reduzimos ou cancelamos o CO2 auto-produzido, é falsa. Mas cultivar é o que mais gostamos e, associado ao cultivo, há uma actividade que, além de ajudar no corte de emissões, garantidamente beneficia o planeta e as pessoas, em qualquer sítio: Produzir os seus próprios alimentos. Ao fazê-lo, criámos muitos benefícios, ambientais e sociais. Imediatamente eliminámos várias etapas numa longa cadeia que gasta energia de forma intensiva. Os alimentos viajam apenas alguns metros, não quilómetros, a embalagem não existe, o desperdício também não. As viagens de automóvel ao supermercado para comprar alimentos são reduzidas. Consumir frutas e legumes colhidos no momento certo é muito mais saudável, logo ficámos menos susceptíveis de necessitar de cuidados médicos intensivos. Pouco me espanta por isso que muitos trabalhos de investigação demonstrem que os que cultivam e produzem de forma biológica (orgânica) tenham uma pegada de carbono 1/3 inferior à média nacional de muitos países na Europa, atingida em parte pelo facto de produzirem os seus próprios alimentos.
Cultive a sua própria horta, é uma tentativa séria de viver de forma mais equilibrada no planeta. E os benefícios de o fazer não acabam no portão do seu jardim. Estará a contribuir para a redução efectiva de CO2 libertada na atmosfera, ao reduzir toda uma cadeia de produção intensiva. Ao cultivar os meus alimentos, estou a cultivar resiliência. Mas a forma como os produzo é tão importante como os próprios alimentos.
Como jardineiro que produz de forma biológica (orgânica), vejo a natureza como um aliado, nunca um adversário. De forma a libertar a nossa força colectiva, todos devemos começar a cultivar desta forma. As alterações no planeta são demasiado evidentes para eternizarmos as discussões ‘biológico vs químico’. Jardinagem e ambiente são questões diferentes.
Quem assim cultiva, está numa posição privilegiada para tomar acções reais e positivas de forma a aliviar alguma da pressão ambiental que sofremos. Mas devemos assumir uma posição crítica em relação à nossa actividade e questionar: somos nós e os nossos jardins realmente amigos da terra?

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