Comunicado sobre a posição da AEPGA em relação à produção de leite de burra

Dado o elevado interesse que a produção de leite de burra em território nacional tem vindo a despertar nos últimos tempos, a Associação para o Estudo e Protecção do Gado Asinino (AEPGA) sentiu a necessidade e a responsabilidade de emitir um comunicado a expressar a sua posição sobre o assunto.


Antes de prosseguir, lembramos que a AEPGA é a entidade oficial responsável pela gestão do livro genealógico da Raça Asinina de Miranda, pelo que tem actuado no sentido de proteger e de aumentar o efectivo destes animais, a par e passo com o estudo e a procura de novos usos para os mesmos. A isso, acrescenta-se a contribuição considerável para a melhoria do bem-estar de burros e mulas em geral (sobretudo no Nordeste Transmontano), graças ao apoio veterinário concedido aos criadores e proprietários da região, e ao acolhimento de animais abandonados, doentes e/ou velhos. 

Os dois principais objectivos deste comunicado são: (1) a clarificação da distinção entre a produção de leite de burra e a utilização deste último como uma mais-valia para os criadores; e (2) o esclarecimento do papel do leite de burra no futuro da raça do Burro de Miranda. 

São vários os estudos recentes que apontam para as qualidades do leite de burra, não só como ingrediente para a confecção de cosméticos e produtos farmacêuticos, mas também como substituto do leite materno humano. Tendo em conta que vivemos numa época em que “empreendedorismo” e “inovação” são tidos como palavras de ordem, não é de estranhar que a produção de leite de burra tenha sido recebida com entusiasmo. Há que considerar, no entanto, as implicações que este tipo de exploração pode ter, a vários níveis. 

No que diz respeito ao bem-estar animal. De forma a garantir que a burra produza leite suficiente para a cria e para a ordenha, é necessário recorrer à ração como suplemento alimentar (quando palha e feno de qualidade, bem como o acesso controlado ao pasto, são a dieta indicada para animais saudáveis e em boa condição corporal), o que geralmente acaba por resultar numa dependência pouco saudável deste alimento. Do mesmo modo, uma cria que não consuma a quantidade ideal de leite, devido à ordenha, passará a depender de ração. 

Num sistema de produção intensiva, desde cedo que a cria é separada da mãe durante o dia, ficando em sua companhia somente durante a noite, o que pode causar stress e ansiedade, sobretudo à primeira. Sabe-se que o enfraquecimento do sistema imunitário e a perda de peso são as duas consequências mais comuns desse estado emocional; ambas põem em causa o ritmo de crescimento das crias, bem como a sua capacidade de resistência a doenças. 

Mais, a tarefa atribuída ao animal é passiva, não contribuindo em qualquer medida para o seu desenvolvimento psico-motor, ao contrário dos papéis tradicionais que, historicamente, o(a) burro(a) desempenha (trabalho agrícola e transporte), ou a que mais recentemente tem sido associado (turismo, sensibilização ambiental, asinoterapia e asinomediação). Nesse sentido, corre-se o risco de perder um conjunto de técnicas e saberes de domesticação tradicionais que primam pelo desenvolvimento individual do animal e pelo estabelecimento de uma relação próxima com o ser humano. 

No que concerne à valorização do Burro de Miranda. A criação em massa de animais (necessária para uma exploração de leite de burra) não será acompanhada, no nosso país, pela absorção dos indivíduos no mercado, o que levanta não só questões de bem-estar animal (qual o destino destes animais “excedentes”?

Qual o destino das burras idosas, já fora de idade fértil?) mas também de valor monetário (havendo excesso de oferta de burros, o seu valor de mercado diminuirá). A isto, infelizmente, é provável que se siga uma desvalorização simbólica e cultural do animal, que a AEPGA e outros tantos se têm esforçado por combater na última década, nomeadamente através da manutenção de um equilíbrio delicado entre a necessidade de reprodução da raça e da garantia da qualidade de vida dos animais. 

Tendo todos estes aspectos em consideração, a AEPGA pretende deixar claro que não apoia a produção de leite de burra enquanto empreendimento de exploração intensiva de gado e que não considera que esse seja um caminho desejável para a preservação e valorização do Burro de Miranda. A produção de leite de burra centra-se no valor económico de um produto do burro, e não no conjunto de valores patrimonial, genético, cultural e simbólico do próprio animal. 

No entanto, há que reconhecer as diferenças entre o tipo de exploração acima descrito e o caso de criadores de animais (Burro de Miranda ou outro) que, conhecendo as suas burras e as necessidades das crias destas, recolham algum leite, não pondo em causa o bem-estar de nenhuma das duas. Assim, e no sentido de procurar incentivos à preservação deste património genético, a AEPGA apoia a dinamização de actividades agro-pecuárias diversificadas que, utilizando uma pequena quantidade de leite, tenham um impacto positivo na economia familiar dos criadores, tendo sempre como prioridade o bem-estar dos animais.

Neste caso, em que o fim é a criação de animais – com o objectivo de encontrar novos usos que os dignifiquem – e não somente a produção de leite, a utilização deste último pode representar uma mais-valia para os criadores e, logo, um incentivo para continuar a eleger o burro como companheiro (também de trabalho nos campos), constituindo-se, assim, como um exemplo desejável de possíveis novos usos. 

Associação para o Estudo e Protecção do Gado Asinino 
Largo da Igreja, n.º 48
5225-011 Atenor (Miranda do Douro)

Tel. 273 739307
Tlm 96 6151131/92 5790395(6)
Correio-electrónico: burranco@gmail.com 

www.aepga.pt

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